A 87ª Promotoria de Justiça de Goiânia encaminhou para a Superintendência Judiciária do Ministério Público de Goiás (MP-GO), para distribuição a uma das Promotorias de Justiça com atuação nas varas criminais dos crimes apenados com pena de reclusão, o inquérito civil instaurado para apurar a notícia de que o ex-deputado federal Jovair Arantes (MDB) teria sido imunizado contra a Covid-19 sem a observância das normas sanitárias e prioridades de vacinação. Em razão do fato, a promotora de Justiça Marlene Nunes Freitas Bueno expediu recomendação ao secretário municipal de Saúde de Goiânia, Durval Ferreira Fonseca Pedroso, para que, no processo de continuidade da vacinação contra o coronavírus dos profissionais da saúde, designe servidores públicos do município para a conferência e certificação da existência do efetivo exercício profissional, conforme especificações contidas no Plano Nacional de Imunização.

A conduta do presidente do Conselho Regional de Odontologia de Goiás (CRO-GO), Renerson Gomes dos Santos, foi, também, encaminhada para avaliação no âmbito criminal. De acordo com a promotora de Justiça Marlene Nunes Freitas Bueno, a imunização do ex-parlamentar, que possui registro no CRO-GO, não teve a devida comprovação da efetiva atuação profissional em espaços e estabelecimentos de assistência e vigilância à saúde, em contato direto com pacientes – requisito indispensável para a legítima habilitação do trabalhador da saúde para a vacinação, nos termos do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. Segundo Marlene Nunes Freitas Bueno, no inquérito civil, “sobressaíram elementos fáticos que devem passar pela aferição por um dos promotores de Justiça com atribuição nas varas dos crimes apenados com reclusão”.

O inquérito civil apurou que a imunização do ex-deputado federal pode ter sido realizada com suposta infringência à normatização técnica instituída pelo poder público para conter a disseminação do vírus da Covid-19. De acordo com a promotora, a conduta, se confirmada, é circunstância de extrema gravidade, por projetar efeitos negativos no alcance da cobertura vacinal dos grupos que apresentam maior risco de desenvolver quadros graves da doença e daqueles mais expostos à contaminação pelo novo coronavírus. O suposto desvio da dose da vacina, segundo ela, do grupo prioritário em proveito do ex-parlamentar é conduta que, em tese, se insere no crime de peculato, previsto no artigo 312 do Código Penal.

Triagem

A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou, no inquérito civil, que, naquela etapa da campanha de vacinação, em conformidade com as diretrizes do Ministério da Saúde, os conselhos profissionais deram apoio para operacionalização da vacinação daqueles que prestavam atendimento direto ao paciente em clínicas e consultórios e que não haviam sido contemplados com a imunização nos hospitais e unidades que realizam atendimento para Covid-19. Os conselhos profissionais realizaram a triagem dos que receberiam a vacina. Para tanto, seriam exigidos documentos, como carteira profissional, comprovantes de endereço e do local de atuação profissional e declaração do profissional autônomo, a ser preenchida no local de vacinação. Foi constatado que a documentação não foi exibida por Jovair Arantes, tampouco localizada pela SMS.

A SMS também registrou que todos os conselhos profissionais que prestaram apoio à ação de vacinação foram devidamente comunicados, de forma prévia, da necessidade de exibição dos documentos para o fim de comprovação de que o profissional de saúde fazia parte do grupo apto a receber a imunização. “Diante disso, suspeita-se que o amplo conhecimento pelo presidente e demais membros do CRO-GO que fizeram a triagem não obstou a vacinação do ex-parlamentar em detrimento da fiel observância da norma imposta pelo poder público”, observou a promotora de Justiça.

Placa para alugar

A 87ª Promotoria de Justiça apurou que, no endereço registrado por Jovair Arantes na Associação Brasileira de Odontologia (ABO) como consultório, há placa indicativa de que o prédio está para alugar. Além disso, foram coletadas reportagens na imprensa em que o ex-parlamentar afirmou estar sem mandato, possui registro regulado no CRO-GO há mais de 40 anos, e que atende pacientes esporadicamente, antigos clientes, e que usa, nesses casos, consultórios de amigos e do sobrinho para atender.

“Tem-se por inafastável a providência de elucidação dos fatos na seara penal, a fim de que, se for o caso, haja a apuração e a responsabilização dos agentes sujeitos ativos de suposta conduta delitiva”, afirmou Marlene Nunes Freitas Bueno. Segundo ela, há elementos a serem avaliados no âmbito penal, que dizem respeito às condutas do presidente do CRO-GO e de Jovair de Oliveira Arantes, porquanto supostamente este foi imunizado contra o coronavírus sem a observância das regras relativas aos grupos prioritários.