Com resultado inconclusivo do teste de DNA para apontar qual dos dois gêmeos idênticos é o pai de uma criança, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) determinou a realização do Twin Test, um exame complexo e de alto custo, realizado em laboratório estrangeiro. Dessa forma, o colegiado cassou sentença singular, proferida na comarca de Cachoeira Alta, que havia reconhecido a dupla paternidade e imposto, aos dois irmãos, o pagamento solidário de pensão. A relatoria do voto, acatado à unanimidade, é do desembargador Anderson Máximo de Holanda.

Gêmeos univitelinos – que é o caso dos réus, ora apelantes – se originam da divisão de um único óvulo fertilizado pelo mesmo espermatozoide. Dessa forma, os irmãos têm DNAs idênticos. Num teste laboratorial comum de paternidade, que analisa algumas sequências de genoma, ambos tiveram probabilidade de 99,99% de serem os genitores da criança. Para resultado mais investigativo, com a procura por mutações que possam identificar o verdadeiro pai, é preciso examinar as 3 bilhões de letras do DNA. Esse diagnóstico específico, chamado Twin Test, não é realizado no Brasil e custa R$ 60 mil, motivo pelo qual não havia sido realizado até então.

Busca pela verdade

Em seu voto, o magistrado relator considerou que a ausência de prova quanto à paternidade “impõe à criança o encargo de suportar dúvida perene a respeito da sua ascendência. A despeito disso, impõe à menor que padeça da mútua abstenção de deveres paternos, tanto biológico como afetivo por parte dos dois requeridos ora apelantes, uma vez que mesmo custeando assistência material, seguirão alienando, reciprocamente, o papel de pai”.

Dessa forma, o autor do voto destacou que é preciso ir além do provimento material à criança, “única resposta jurisdicional dada até o momento”. O magistrado considerou que “é necessário não apenas promover encerramento ao processo, mas sim buscar resultado útil ao deslinde material, a fim de entregar a tutela específica pretendida”.

Ainda na decisão, o desembargador Anderson Máximo de Holanda também frisou que é dever do magistrado desempenhar diligências a fim de buscar a noção de verdade dos fatos. “Não se trata, aqui, de busca pela insofismável ‘verdade absoluta’ que escapa do domínio da cognição humana, mas o zelo com os elementos que permitam perquirir a maior correspondência entre a matéria posta e o fenômeno concreto que ensejou a propositura da ação”.

Entenda o caso

Os réus, gêmeos univitelinos, moradores de Cachoeira Alta, a 358 quilômetros de Goiânia, se aproveitavam da extrema semelhança física, desde crianças, para pregar peças. A partir da adolescência, a dupla se valia da aparência idêntica para ocultar traições e angariar maior número de mulheres. Da torpeza de comportamento de ambos, nasceu uma menina – cuja paternidade era impossível para a ciência distinguir entre os dois.

A mãe da criança contou que teve um relacionamento breve com o pai da sua filha, que acreditava ser o primeiro réu. Ela conheceu o homem numa festa de amigos em comum. “Ele me contou que tinha um irmão gêmeo, mas não cheguei a ser apresentada. Na hora, não desconfiei de nada”. Depois, quando precisou ligar os fatos, a mulher começou a colocar em dúvida a identidade do rapaz. “O estranho no dia é que ele se apresentou com um nome, mas estava com a motocicleta amarela do irmão”.

Embate

Inicialmente, a mulher havia ajuizado a ação de reconhecimento de paternidade contra o primeiro réu. Ele se submeteu ao exame de DNA, e quando o resultado deu positivo, ele indicou o irmão como o verdadeiro pai. Por sua vez, o segundo réu também fez o mesmo teste, dando resultado igual – 99,9% de chances de ser o genitor da menina. “É uma atitude muito triste, não precisavam disso. Eles sabem a verdade, mas se aproveitam da semelhança para fugir da responsabilidade”, contou a mulher.

Diante do impasse, já que nenhum dos homens quis se responsabilizar, em abril de 2019, o juiz da comarca, Filipe Luís Peruca, determinou que ambos fossem incluídos na certidão de nascimento da menina e que pagassem, cada um, pensão alimentícia no valor de 30% do salário mínimo. Com a cassação da sentença, realizada, agora, pelo colegiado, a assistência material será paga apenas pelo primeiro réu, enquanto não houver resultado do novo exame.