Com um orçamento inicial de R$ 10 milhões, a trincheira faz parte do projeto BRT Norte/Sul e será realizada em três etapas.

Conforme foi divulgado, o trânsito no Setor Sul, em Goiânia, já foi alterado para a construção de uma trincheira entre a Rua 90 e a Avenida 136. As obras começaram na última segunda-feira, 1º, e tem previsão de conclusão em novembro de 2019. Com um orçamento inicial de R$ 10 milhões, a trincheira faz parte do projeto BRT Norte/Sul e será realizada em três etapas.

A prefeitura de Goiânia alega que a obra deve desafogar o trânsito na região. No entanto, os possíveis benefícios gerados pela construção permanecem alvos de inúmeros questionamentos. Além do impacto negativo para o comércio local, também tem sido questionados os danos ambientais decorrentes da perfuração. Acontece que o lençol freático da região é raso e o escoamento ou bombeamento da água se faz necessária. Talvez seja esta a maior crítica dos contrários ao projeto. Mas não só.

Para entender melhor os riscos e possíveis consequências da implantação da trincheira no cruzamento dessas avenidas, a reportagem ouviu técnicos do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), da Associação para Recuperação e Conservação do Ambiente (Arca) e do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO). Há quem discorde, critique, e quem avalize a regularidade do processo.

CAU-GO

Segundo a conselheira do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), Maria Ester, o Conselho ainda não construiu uma resposta sobre as questões que envolvem a obra. Apesar de não ter conhecimento sobre a possibilidade de embargo, a arquiteta afirma que o Setor Sul é uma espécie de bacia que conta com a presença de um lençol freático muito superficial — esta é uma das principais criticas à obra que, segundo o projeto, terá uma profundidade de 9 metros.

“Se o lençol tiver que ser drenado isso irá impactar toda região. Do ponto de vista de quem luta diariamente por uma cidade com mais área verde e menos danos ao ambiente, a drenagem irá impactar drasticamente. Precisamos de mais detalhes sobre essa obra. Não temos dados técnicos sobre isso e sem eles não podemos entender os verdadeiros riscos”, considerou a conselheira.

Apesar do prejuízo ao ambiente, outro ponto importante levantado pela arquiteta foi que este “é um projeto para os carros”. “O ideal seria um plano de mobilidade mais ampliado. Talvez uma trincheira não seja o mais adequado. A partir do momento que a população é estimulada a se locomover de outras maneiras, uma trincheira como essa perde efeito”, explicou a conselheira antes de disparar: “Sem contar que não temos a cultura de manutenção dessas obras. Ou seja, futuramente, ela poderá se tornar só mais uma dentre as diversas obras cheias de problemas que vimos nas últimas semanas”.

ARCA

O mesmo problema foi reportado pelo presidente da Associação para Recuperação e Conservação do Ambiente (Arca), Gerson Neto. Em entrevista, Neto ressaltou que assim que estiver pronta, a construção será destinada exclusivamente aos carros da capital. “Há anos o corredor exclusivo já funciona muito bem ali. Mesmo com a obra pronta os carros não vão circular muito bem pois há engarrafamento em outros pontos anteriores e posteriores a este ponto específico. E não podemos esquecer que quando mais abrirmos espaço para os carros, menos espaço haverá para outros modais de transporte”, ressaltou.

Quanto aos impactos ambientais, Neto diz que a prefeitura de Goiânia parece desconhecer a realidade. “O lençol freático raso é algo reportado por moradores. Vimos diversas fotos circulando sobre isso. Acho que a prefeitura está realizando essa obra sem fazer as devidas pesquisas”. O presidente da Arca disse ainda que “a caixa de recarga do Setor Sul é muito grande. Sem contar que o subsolo é saudável, ao contrário da maior parte da cidade. Ali é, na verdade, um local para preservarmos com muito carinho. Talvez seja por conta daquela região e de alguns outros bairros que o rio botafogo ainda corra o ano inteiro”, completou.

Por fim, o presidente considerou difícil que a obra não se concretize. “Mas a gente precisa debater esse tema. Este é o momento. Outras obras estão a caminho, como a construção de um viaduto na 136 e o prolongamento da marginal botafogo, que é tão criminosa quanto essa no cruzamento das avenidas 90 e 136. Precisamos antecipar essa conversa e evitar que o mesmo ocorra no futuro”, pontuou.

CREA

O engenheiro Alexandre Garcês, do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO) explicou que teve acesso ao estudo da obra e informa que a previsão apresentada nos textos é de que se siga os padrões de rebaixamento de lençol freático. Segundo Garcês, o laudo apresentado por uma empresa terceirizada demonstra que o nível o lençol está nos padrões de outras obras como a Praça do Ratinho e Viaduto da T-63. Pela previsão do estudo, Garcês explica que o nível oscila entre 4,5 e 8 metros e prevê que seja necessário o rebaixamento do lençol freático em aproximadamente 3 metros, o que é padrão.

O engenheiro diz ainda não entender a repercussão que a obra ganhou, já que segue padrões de obras realizadas na história de Goiânia. Para Alexandre Garcês o dano ambiental é realidade, mas sobrepõe os benefícios que a conclusão da obra trará à população. “O recuo do lençol que será feito é proporcional ao recuo que realizam na construção de cerca de três prédios, entretanto o benefício dessa obra virá para um número muito maior de pessoas”

Como aspectos que devem ser observados, o engenheiro ressalta a necessidade de cobrar quais serão as ações de compensação ambiental a serem realizadas. Essas ações são previstas pela legislação e obriga uma contrapartida, desde reflorestamento à construção de praças. Ele informa que o Crea irá monitorar a obra.

Fonte: Jornal Opção