Crimes foram praticados entre 2009 e 2015 em atendimentos espirituais particulares.

Em coletiva de imprensa concedida na tarde desta terça-feira (28), a Força-tarefa do Ministério Público de Goiás (MP-GO) criada para investigar crimes sexuais supostamente praticados por João de Deus deu detalhes sobre a nova denúncia apresentada contra o médium. Com essa, são nove ações penais contra o denunciado, sete delas de cunho sexual. Caso o médium seja condenado nessa denúncia, a pena vai variar entre 40 e 90 anos.

A nova ação envolve 10 mulheres. Seis delas são supostas vítimas do crime de estupro de vulnerável, enquanto as demais são testemunhas, uma vez que os crimes estão prescritos. Todas elas, de acordo com o MP, procuraram auxílio do médium e foram abusadas enquanto recebiam atendimento espiritual em uma sala reservada.

Os crimes foram cometidos entre os anos de 2009 e 2015. As vítimas, segundo o MP, são dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e do Distrito Federal. De acordo com a promotora Ariane Patrícia Gonçalves, confirmou que uma delas é deficiente visual, mas que não podia revelar mais informações para protege-las.

Ariane disse ainda que as mulheres não se conheciam, mas todos os relatos foram bastante semelhantes. “Apesar de as vítimas nunca terem tido contato uma com a outra e não se conhecerem, elas têm relatos muito parecidos, com detalhes de muita semelhança. E a explicação é uma só: elas passaram pela mesma situação, pelo mesmo tipo de abuso, pelo mesmo abusador”, explicou a promotora.

Abusador em série

O MP revelou também que João de Deus, em todos os casos, usou de termos ligados à religiosidade, à espiritualidade e à cura para convencer as vítimas de que aquele ato sexual fazia parte de um tratamento. “Eram pessoas vulneráveis que viam nele a última esperança de uma cura ou alento espiritual. Existia uma confiança e uma fé extrema”, disse a promotora.

A promotora afirmou ainda que o relato das testemunhas é importante para investigações, embora os crimes estejam prescritos. “[Os depoimentos das testemunhas] tem a função de corroborar os crimes e traçar o perfil psicológico do denunciado. Para mostrar que ele não praticava esses crimes de maneira ocasional, mas de maneira continuada e habitual. Era um agressor sexual em série”.

“Um número interminável de vítimas”

Os promotores presentes disseram também que o caso é de estupro de vulnerável porque as mulheres não tinham condições de reagir à situação. De acordo com a Força-tarefa, os crimes eram cometidos em uma sala trancada, com pessoas vigiando do lado de fora.

“O contexto de autoridade do líder religioso não permitiu que elas reagissem. O ambiente não possibilitava qualquer tipo de reação”, disse o promotor Augusto César Souza.

O promotor afirmou também que as sete denúncias de estupro de vulnerável envolvem 80 vítimas. Além disso, 100 outros casos estão sendo investigados. Ele confirmou também que o MP recebe denúncias até hoje, embora em número menor. “É um número interminável de vítimas”, disse Augusto.

Saúde de João Deus

Questionados sobre o estado de saúde do médium, os promotores afirmaram que não podem mais acompanhar os laudos e diagnósticos médicos de João de Deus em virtude de uma decisão da justiça, expedida pela Comarca de Abadiânia.

Tudo começou quando a defesa de João de Deus solicitou que médicos particulares avaliassem o estado de saúde dele. A autorização foi dada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A nova avaliação dizia que o médium deveria ser internado, ao contrário do que afirmavam os médicos do Núcleo de Custódia.

A internação do denunciado foi autorizada também pelo STJ, após nova solicitação da defesa. O MP então passou a solicitar informações sobre o estado de saúde para averiguar a diferença entre as versões do Núcleo de Custódia e dos médicos particulares. A decisão da Comarca de Abadiânia, entretanto, impediu o envio dessas informações.

“Por ser uma pessoa que está presa, a responsabilidade da saúde dela é do estado”, disse Augusto. As divergências [entre as avaliações médicas] levaram o MP a investigar o caso por que essa situação não acontece com frequência, é excepcional”.

A internação de João de Deus e o impedimento do MP de acompanhar o seu estado de saúde pode atrapalhar a apresentação de novas denúncias, uma vez que o médium precisa ser interrogado. É necessário saber, de acordo com a força-tarefa, se ele tem condições de ser interrogado, seja no prédio do órgão, seja no hospital.

“Quem pode dizer isso são os médicos particulares contratados pela defesa dele”, ressaltou Augusto. “O que for preciso fazer, dentro da lei, para exercer as funções, nós faremos”, concluiu o promotor.

Fonte: Mais Goiás