Uma petição de um processo que tramita no Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) chama juízes de “escrotos”, “corruptos”, “desgraçados”, “criminosos”, entre outras acusações e ofensas. A ação é assinada pelo advogado Lucas Bernardino de Castro, que tenta reaver o cargo público de auxiliar de autópsia que exercia na Polícia Técnico-Científica, em Goiânia.

O documento é datado de 22 de outubro de 2020. O G1 não conseguiu localizar o advogado para pedir uma posição sobre o caso.

A Associação dos Magistrados de Goiás (Asmego) publicou uma nota em suas redes sociais dizendo que repudia os ataques. “O referido advogado, além de agir de forma completamente desrespeitosa, sem guardar o decoro que é exigido à função que ocupa, incorre em crimes contra a honra, tais como calúnia e difamação”, lê-se no comunicado (veja íntegra ao fim da reportagem).

A Ordem dos Advogados do Brasil Seção Goiás (OAB-GO) também se posicionou sobre o caso, informando que “já adotou internamente as providências necessárias à apuração de infração ético-disciplinar, na qual lhe será assegurada a ampla defesa” (confira a nota completa ao final do texto).

O autor da petição afirma, no documento, que está há dois anos tentando reaver o cargo que tinha na Polícia Técnico-Científica e argumenta que foi exonerado de forma “criminosa”.

“Está provado no processo que me afastaram do cargo e cortaram meu salário por mais de 1 ano sem haver nenhum processo administrativo tratando disso. Por puro assédio moral”, defende o advogado no documento.

A Polícia Técnico-Científica afirmou que “todos os procedimentos de apuração de transgressões disciplinares que tramitam na Corregedoria de Polícia são conduzidos conforme exigem os trâmites legais, respeitando os princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal” (leia posição na íntegra ao fim da reportagem).

O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) também se posicionou sobre o caso. O órgão afirmou que “decisões judiciais podem ser questionadas pelo recurso próprio e adequado, mas a deliberada agressão, com utilização de termos que demonstram violência e desrespeito aos magistrados,[…] é um ataque ao Poder Judiciário” (confira íntegra ao final do texto).

Advogado xinga juízes em processo no Tribunal de Justiça de Goiás

Ofensas aos magistrados

O advogado começa a petição chamando o juiz responsável pelo caso de “escrotíssimo”, “corrupto”, “sociopata” e “desgraçado”. Ele continua escrevendo que vai “desrespeitosamente” apresentar ao magistrado o recurso de apelação “porque corrupto não merece respeito”.

“Escrotíssimo senhor juíz de direito (corrupto, sociopata e desgraçado) da 4ª Vara da Fazenda Pública Estadual. […] Venho desrespeitosamente (porque corrupto não merece respeito) perante vossa excelência, um juiz corrupto, sociopata e sem vergonha na cara, apresentar recurso de apelação”, escreve o advogado.

Também no documento, o advogado afirmou estar “indignado com a sentença criminosa proferida no evento 102 do presente processo”. A decisão a que ele se refere determinava a extinção do processo, em março de 2020, argumentando que “apreciação judicial já foi solucionada”.

Bernardino escreveu que o processo em questão “é uma fraude” e o caracteriza como “pura esculhambação patrocinada pelos seguintes magistrados, um mais malandro que o outro”.

O advogado acusa os juízes de vários crimes:

“Em tese, dentro desse processo esses pilantras já cometeram os crimes de prevaricação, falsidade ideológica, calúnia, difamação, abuso de poder, condescendência criminosa e formação de quadrilha”.

Na petição, ele detalhou todo o processo e criticou as decisões dos juízes, dizendo que são “gente que não tem o menor compromisso com a lei” e “mau-caráter que suja o nome do Poder Judiciário e só prolifera”.

Ao final do documento, o advogado pede que o emprego dele seja devolvido, que a Corregedoria do TJ-GO seja informada sobre as acusações feitas na petição, que a sentença que extinguia o processo seja anulada e que o magistrado responsável pela Vara seja considerado suspeito.

Após esta petição, cinco juízes deixaram de atuar no caso por “razões de foro íntimo” e pediram a redistribuição do processo.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Notas na íntegra

Asmego

A Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego) vem a público repudiar os ataques direcionados a seis juízes pelo advogado Lucas Bernardino de Castro. Em recurso de apelação encaminhado a um dos juízes, o advogado o denomina “corrupto, sociopata, sem vergonha e desgraçado”, e cita os outros cinco, os quais classifica como “um mais malandro do que o outro”.

O referido advogado, além de agir de forma completamente desrespeitosa, sem guardar o decoro que é exigido à função que ocupa, incorre em crimes contra a honra, tais como calúnia e difamação.

A Asmego espera que a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) adote as medidas necessárias nesse caso, e lamenta profundamente o ocorrido que, além de ferir pessoas íntegras, mancha a imagem dos nobres advogados de Goiás que trabalham de forma correta e ética.

OAB-GO

A Ordem dos Advogados do Brasil – seção Goiás (OAB-GO) tomou conhecimento de evento incomum envolvendo advogado regularmente inscrito que, no exercício da profissão e também em causa própria, peticionou em termos e expressões incompatíveis com a urbanidade, técnica e com o bom-senso exigidos à boa pratica advocatícia.

Em razão da grande repercussão do caso, a OAB-GO informa que já adotou internamente as providências necessárias à apuração de infração ético-disciplinar, na qual lhe será assegurada a ampla defesa.

Ao mesmo tempo, a utilização de termos tão desconectados da grandeza da função advocatícia despertou a atenção da Diretoria e do Conselho Seccional sobre a eventual necessidade pessoal e de saúde do advogado, pelo que, atento ao aspecto humano, também adota a Seccional cautelas nesse particular.

Polícia Técnico-Científica

A propósito do pedido de nota feito pelo G1 sobre o Recurso de Apelação assinado por ex-servidor instituição, a Superintendência de Polícia Técnico-Cientifica da Secretaria de Segurança Pública de Goiás informa o que se segue:https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

– Todos os procedimentos de apuração de transgressões disciplinares que tramitam na Corregedoria de Polícia são conduzidos conforme exigem os trâmites legais, respeitando os princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal.

– São aplicadas punições (de advertência, suspensão ou demissão, conforme o caso) tão somente nos casos de restarem comprovadas a materialidade e a autoria dos fatos.

– É ressaltada, ainda, a possibilidade do servidor condenado administrativamente procurar o Poder Judiciário para recorrer da punição imposta. Sempre, é claro, na devida forma, e principalmente com respeito às autoridades constituídas.

– Diante disso, nesse caso concreto, é entendido que quaisquer questionamentos jurídicos relacionados ao episódio devem ser direcionados ao Judiciário.

– É salientado que, diante da demissão (punição) já efetivada, não há mais qualquer procedimento administrativo em trâmite relativo a este caso específico no âmbito da Polícia Científica.

TJ-GO

O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), por seu presidente, desembargador Carlos França, repudia os ataques direcionados a seis magistrados do Judiciário goiano pelo advogado Lucas Bernardino de Castro e lamenta as palavras utilizadas pelo profissional que, ao peticionar em causa própria, utilizou-se de termos inaceitáveis e incompatíveis com o exercício da Advocacia.

Ressalta também que decisões judiciais podem ser questionadas pelo recurso próprio e adequado, mas a deliberada agressão, com utilização de termos que demonstram violência e desrespeito aos magistrados, em razão de fundamentação utilizada para decidir e por discordar do desfecho dado à ação, é um ataque ao Poder Judiciário, que tem a missão constitucional de solucionar conflitos que lhes são apresentados.

Por fim, o TJGO reforça que acredita e valoriza o respeito e a harmonia costumeira entre os membros do sistema de Justiça. Ademais, segue confiante nas providências que estão sendo adotadas pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) para apuração da infração ético-disciplinar do advogado, sem prejuízo de providências na esfera penal por parte dos órgãos com atribuições para tanto.

G1