Aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) avaliam que a prisão do ex-ministro Milton Ribeiro (Educação), nesta quarta-feira (22), coroa o pior momento da campanha eleitoral do mandatário, que aparece em segundo lugar nas pesquisas, distante do líder Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Já apreensivos com a alta do preço dos combustíveis, anunciada na semana passada pela Petrobras, pessoas próximas do presidente dizem que a prisão abala ainda mais um dos pilares da campanha, que é o discurso anticorrupção, usado para fazer frente ao ex-presidente petista.
Como mostrou a coluna Mônica Bergamo, da Folha, aliados de Bolsonaro dizem que o episódio é um “verdadeiro desastre”.
A oposição, por sua vez, vai se aproveitar do episódio exatamente para apontar novas contradições no discurso do mandatário de que não haveria ilícitos em sua gestão. Aliados de Lula, por exemplo, reforçaram nesta quarta-feira a defesa da abertura de uma CPI para investigar o MEC.
Ribeiro foi preso pela Polícia Federal sob suspeita de ter cometido quatro crimes: corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência.
Um integrante do núcleo duro da campanha bolsonarista diz que “não tem vida fácil”, ao comentar a detenção de Ribeiro e de pastores ligados ao governo. Este aliado de Bolsonaro, porém, rechaça a tentativa da oposição de colar a prisão do ex-ministro no presidente, indicando a estratégia a ser adotada.
Outro aliado de Bolsonaro, ministro do governo, alega que a investigação não citou o presidente, portanto, não haveria nem por que tentar descolá-lo da prisão.
Além de Ribeiro, os dois pastores, Gilmar Santos e Arilton Moura, são peças centrais no escândalo do balcão de negócios do ministério. Como mostrou a Folha, eles negociavam com prefeitos a liberação de recursos federais mesmo sem ter cargo no governo. Os pastores também foram presos.
Os recursos são do FNDE, órgão ligado ao MEC controlado por políticos do centrão, bloco político que dá sustentação a Bolsonaro desde que ele se viu ameaçado por uma série de pedidos de impeachment e recorreu a esse apoio em troca de cargos e repasses de verbas federais.
O fundo concentra os recursos federais destinados a transferências para municípios.
Diante da prisão de Ribeiro, a linha da campanha em defesa do mandatário é que a apuração ainda não evidenciou nenhuma delação, por exemplo, como a do ex-ministro Antonio Palocci, titular da Casa Civil e da Fazenda dos governos petistas, que acusou Lula de atos de corrupção.
Apesar do argumento, em áudio revelado pela Folha, o então ministro da Educação Milton Ribeiro disse que priorizava demandas dos amigos de um dos pastores a pedido de Bolsonaro.
Na gravação revelada pela Folha, o ministro diz ainda que isso atende a uma solicitação do presidente Bolsonaro e menciona pedidos de apoio que seriam supostamente direcionados para construção de igrejas. A atuação dos pastores junto ao MEC foi revelada anteriormente pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Ribeiro foi nomeado ministro em julho de 2020 e deixou o cargo em março deste ano, uma semana depois da revelação do áudio, investigado por um balcão de negócios no Ministério da Educação e na liberação de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
O esquema seria operado por Ribeiro e pastores próximos do governo.
A PF também cumpriu mandados de busca e apreensão em endereços de Ribeiro, de Gilmar e do pastor Arilton —esses dois últimos são ligados a Bolsonaro e apontados como lobistas.
Integrantes da campanha de Bolsonaro dizem ser preciso ter cautela para verificar os desdobramentos da operação da PF.
A constatação é a de que, se houve prisão, a polícia pode ter provas e elementos contundentes para ter realizado a operação. Qualquer tentativa de defender Ribeiro das acusações, portanto, pode ser um tiro no pé.
Nesta quarta, o próprio Bolsonaro deu o tom do discurso que será usado para defendê-lo: o de tentar se descolar do ex-ministro e dizer que a PF tem autonomia sob sua gestão.
Bolsonaro disse nesta quarta que “a imprensa vai dizer” que Ribeiro é ligado a ele, mas que é preciso ter “paciência” em relação a isso.
“Ele que responda pelos atos dele, eu peço a Deus que não tenha problema nenhum”, disse o presidente, em entrevista à rádio Itatiaia de Minas Gerais. “Se a PF prendeu, tem um motivo, e o ex-ministro vai se explicar”, completou.
O mandatário ainda afirmou que “houve denúncia” de que o ex-ministro “teria buscado prefeito, gente dele para negociar, buscar recurso” e que logo o “afastou” do cargo.
Na realidade, porém, a exoneração, conforme publicado no Diário Oficial, ocorreu “a pedido” de Ribeiro, e não por ordem de Bolsonaro. Antes, inclusive, o presidente havia dito que “botaria a cara no fogo” pelo então auxiliar.
Nesta quarta, como vacina, Bolsonaro já disse que não pode ser responsabilizado pelo caso porque não consegue ter controle sobre todos os ministérios e secretarias do Executivo.
O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) classificou o episódio como “lamentável”.
“Eu não quero ser leviano de acusar. Não é um episódio que ajuda o governo, mas, ao agir imediatamente, deixar a investigação correr e que a punição ocorra logo, é uma forma diferente de governar com relação ao que a gente via antes”, disse o deputado.
“Antes, dava-se o cargo de ministro ao investigado para se ter imunidade para não ser preso. Há uma diferença monstruosa.”
O pastor e parlamentar Marco Feliciano (PL-SP) fez publicações no Twitter em que afirma ser um “dia muito triste” para Igreja Evangélica de vertente Pentecostal.
“A prisão do PR Gilmar Santos, pelo qual, como pregador da palavra, sempre tive respeito e admiração, nos causa um profundo constrangimento. Nos resta apenas aguardar os desdobramentos”, avaliou Feliciano.
Apesar da tentativa de descolamento, a investigação sobre Ribeiro macula a campanha de Bolsonaro não apenas por atingir um ex-ministro, mas por mirar no FNDE, órgão controlado pelo centrão, grupo de partidos que dá sustentação a Bolsonaro.
O FNDE foi entregue aos políticos como forma de o presidente criar uma base de apoio no Congresso para evitar o avanço de pedidos de impeachment.
Folha de S. Paulo