A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid decidiu nesta quarta-feira (16) retirar o sigilo de documentos enviados à Comissão pelo Ministério das Relações Exteriores, pelo Ministério da Saúde e pela Fiocruz.
A CPI da Covid apura as ações do governo federal e o repasse de verbas da União aos governo locais. A comissão já recebeu centenas de documentos que ficam guardados em uma sala-cofre, entre eles, telegramas sigilosos do Itamaraty e documentos da Controladoria-Geral da União sobre investigações.
Os senadores decidiram pela quebra do sigilo de alguns documentos, pois entenderam que há ‘interesse público’ em dados sobre negociações de vacinas e insumos para pandemia. A medida também atingiu informações encaminhadas por fornecedoras de oxigênio, como a empresa Air Liquide.
Com a reclassificação aprovada pela comissão, os documentos, antes tratados como confidenciais, passaram a ser públicos. Há a exceção em alguns casos, como contratos entre empresas e o governo brasileiro, cuja proteção das cláusulas será mantida em sigilo.
Senadores governistas, como Ciro Nogueira (Progressistas) e Marcos Rogério (DEM-RO), pediram cuidado na divulgação de documentos, principalmente aqueles enviados pelo Ministério das Relações Exteriores.
No início da sessão, o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM) informou que há documentos que estão disponíveis no Portal da Transparência e que o governo envia como sigilosos. Segundo o presidente da CPI, a comissão já recebeu 1,5 TB de informações.
“[…] Tem até documentos que estão no Portal da Transparência que o governo mandou pra cá como sigiloso. Estão no Portal da Transparência, e ele manda como sigiloso. Uma forma de tentar obstruir a investigação, correto? Porque é muito fácil botar lá o carimbo ‘sigiloso'”, afirmou Aziz.
Aziz contou ainda que nesta terça-feira (15) o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o informou que o chanceler Carlos França tinha entrado em contato com ele para tratar do assunto.
“Em relação ao Ministério das Relações Exteriores, ontem eu recebi um telefonema do Presidente Rodrigo Pacheco, que o Chanceler entrou em contato com ele e nós vamos ter todos os cuidados, se necessários”, disse.
O vice-presidente da CPI, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), ponderou que dois terços dos documentos enviados são realmente sigilosos e assim serão mantidos, entre eles, inquéritos no Ministério Público.
“Não cabe a nós, nós não temos competência pra fazer o afastamento de sigilo desses documentos”, disse.
Vacinas e contratos
Entre os documentos que foram alvo da quebra de sigilo, estão arquivos enviados pelo Ministério da Saúde no dia 10 de junho. O relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), mencionou que constam nos documentos informações sobre requisições de vacinas e agulhas e as respectivas respostas de empresas.
Ao justificar a retirada do sigilo, Calheiros afirmou no requerimento que se trata de informação de “interesse público”. Para ele, “em face do princípio da publicidade dos atos administrativos, não podem estar sujeitas ao sigilo”.
O relator pontuou que será preservado o sigilo relativo aos contratos entre a União e as empresas Pfizer e Janssen, diante da cláusula de confidencialidade alegada.
O mesmo valerá para a Fiocruz, visto que a comissão solicitou a íntegra do contrato de encomenda tecnológica com a Astrazeneca.
Relações Exteriores
Com relação ao Itamaraty, entre os documentos que foram alvos da quebra de sigilo estão informações relativas a viagem feita por uma comitiva brasileira para Israel, em março deste ano, com o objetivo de conhecer um spray nasal ainda em fase de estudos contra a Covid-19.
A medida ainda recairá sobre informações e documentos referentes a adesão do Brasil ao consórcio internacional Covax Facility.
O senador Randolfe Rodrigues ressaltou no requerimento que “resta preservado o sigilo dos documentos classificados inequivocamente como reservados, conforme a distribuição de pastas que o Ministério das Relações Exteriores realizou nesses arquivos”.
Oxigênio
A comissão também decidiu tornar públicos documentos enviados por empresas fornecedoras de oxigênio – o desabastecimento do insumo em Manaus é um dos objetos da comissão.
Randolfe informou no requerimento que há mensagens, e-mails e áudios encaminhados, mas ressaltou que as conversas tratam “a respeito de assuntos de interesse público, não de assuntos particulares, o que afastaria o sigilo de comunicações e o direito à privacidade”.
Quebra de sigilo telefônico, telemático, fiscal e bancário
A CPI da Covid também aprovou nesta quarta-feira (16) a quebra dos sigilos telefônico, telemático, fiscal e bancário dos empresários Carlos Wizard e Francisco Emerson Maximiano.
A chamada “transferência” do sigilo telefônico inclui o registro e a duração de todas as ligações feitas e recebidas conforme período delimitado pelos senadores.
A transferência do sigilo telemático prevê o envio de uma série de informações, entre as quais cópias do conteúdo armazenado, lista de contatos, cópia de e-mails e localizações de acesso à conta.
Randolfe Rodrigues é um dos autores dos pedidos de quebra de sigilo e afirmou que a medida é necessária para a apuração pela CPI de eventual enriquecimento ilícito das farmacêuticas fabricantes de medicamentos do chamado kit Covid, tratamento com drogas sem eficácia contra a Covid.
A relação dessas empresas com o governo do presidente Jair Bolsonaro também é alvo de investigação, uma vez que o presidente e o Ministério da Saúde promoveram o uso das drogas por pacientes infectados com o novo coronavírus.
A comissão também aprovou as quebras dos sigilos de Renato Spallici e Renata Spallici, respectivamente presidente e diretora da empresa Aspen farmacêutica, laboratório que produz cloroquina, remédio ineficaz para a Covid-19.
O empresário José Alves Filho, sócio-administrador da empresa Vitamedic, também foi atingido com a medida.
Convocações
Nesta quarta, os senadores também aprovaram a convocação:
- de um representante, com nome a ser definido, da farmacêutica Janssen;
- dos deputados estaduais do Amazonas Péricles Rodrigues do Nascimento e Fausto Junior, presidente e relator da CPI da Saúde, que apura sobre desvios de recursos públicos no enfrentamento à Covid-19;
- e de Francisco Maximiano, sócio da Precisa Medicamentos, também alvo da quebra de sigilo.
A comissão, por outro lado, rejeitou a convocação de Carlos Eduardo Gabas, secretário Executivo do Consórcio do Nordeste.
A oitiva de Gabas, que foi ministro durante o governo Dilma Rousseff, era um dos principais pedidos de senadores aliados ao governo. No requerimento para ouvir Gabas, eles sustentavam a necessidade de apurar sobre a suposta fraude na compra de ventiladores pulmonares para a Covid. O pedido foi derrotado por 6 votos a 4.
G1