Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, apresentaram nesta quinta-feira (30) a proposta para o chamado “arcabouço fiscal”. A nova regra para as contas públicas vai substituir o teto de gastos.
Com a nova regra, o governo Lula pretende controlar o gasto público e sair do vermelho, sem tirar dinheiro das áreas que considera essenciais, como saúde, educação e segurança. E também garantir recursos para investir em obras e projetos que ajudem a economia a crescer.
A expectativa é controlar despesas e frear o aumento da dívida – assim, os juros poderiam cair.
Veja abaixo como funcionarão as regras, assim que aprovadas:
Quais os principais tópicos?
As contas públicas perseguirão uma meta de resultado primário; nos próximos anos, a meta busca um superávit (com receitas maiores que despesas), antes do pagamento de juros da dívida.
Essa meta tem um intervalo de cumprimento em percentual do PIB.
Se as contas estiverem dentro da meta, o crescimento de gastos terá um limite de 70% do crescimento das receitas primárias (ou seja, da arrecadação do governo com impostos e transferências).
Já caso o resultado primário fique abaixo da banda de tolerância da meta, o limite para os gastos cai para 50% do crescimento da receita.
Há também uma banda de crescimento real da despesa primária (acima da inflação), que vai de 0,6% a 2,5% ao ano.
Há um piso anual para investimentos públicos, com base no previsto pelo Orçamento em 2023 (cerca de R$ 70 bilhões) e corrigido pela inflação ao longo do tempo.
Qual a informação mais importante?
O centro da proposta do Ministério da Fazenda é manter o resultado primário (saldo entre a arrecadação e as despesas do governo, sem considerar o pagamento de juros da dívida) positivo e dentro da meta estabelecida para os próximos anos.
Atualmente, a meta de resultado primário é um valor exato – e uma das mudanças propostas pelo arcabouço é que haja um intervalo de resultados possíveis (veja mais detalhes no próximo tópico).
Quando o governo estiver dentro da meta, o crescimento máximo dos gastos está limitado a 70% do crescimento da receita apurada no ano anterior. O dado será considerado entre julho de um ano e junho do ano seguinte, para permitir a inclusão das metas na proposta do orçamento.
Então, na prática, se o montante arrecadado pelo governo aumentar R$ 100 bilhões nesse período, por exemplo, os gastos públicos poderão ser elevados em até R$ 70 bilhões no ano seguinte — desde que o resultado primário esteja dentro do intervalo estabelecido e o aumento não seja maior que um crescimento real de 2,5% contra o ano anterior (saiba mais abaixo).
Dessa forma, o governo espera dar previsibilidade para os gastos, reduzir os juros do país e, assim, controlar a trajetória da dívida pública.
O que muda em relação ao teto de gastos, aprovado no governo de Michel Temer, é que a possibilidade de gastos públicos aumenta conforme a arrecadação do governo, e não com uma trava rígida e de acordo com a inflação do ano anterior.
O entendimento do governo Lula é que o teto de gastos engessa o orçamento e não permitiu que o país investisse como deveria nos últimos anos, trazendo prejuízos para diversas áreas, como infraestrutura, moradia, educação e saúde.
Como vai funcionar?
O intervalo, ou “banda”, para o resultado do primário vai funcionar nos moldes do que hoje acontece com o sistema de meta da inflação: existe o centro da meta e as faixas de tolerâncias para mais e para menos.
Para 2024, por exemplo, a meta do governo é igualar a receita e a despesa – o que resultaria em um resultado primário de 0% do PIB. Pelo sistema proposto, a meta será considerada “cumprida” se ficar entre um déficit de 0,25% e um superávit de 0,25%.
Caso o resultado primário do governo fique acima do teto da meta, o excedente poderá ser utilizado para investimentos. Se o resultado primário ficar abaixo da banda, as despesas no ano seguinte poderão crescer somente 50% do crescimento da receita no exercício seguinte.
Além disso, há ainda limites, mínimo e máximo, para o crescimento real (descontada a inflação) da despesa primária, que varia entre 0,6% e 2,5%.
Caso o Brasil tenha dificuldade de compor as receitas (cumprir metas e arrecadar impostos), o crescimento real dos gastos não poderá ser inferior a 0,6%.
Já em bons anos, em que o Brasil conseguir aumentar muito a arrecadação, o crescimento real dos gastos não pode ultrapassar 2,5%.
Na prática, esse intervalo funcionará como o novo teto de gastos. O teto anterior previa a correção dos gastos apenas pela inflação — ou seja, com crescimento real de 0%. Essa nova regra flexibiliza o limite anterior.
Um ponto: a proposta prevê que as despesas de saúde cresçam a 15% da receita líquida e as de educação, a 18%. Ou seja, terão crescimento real, acima da inflação.
O novo arcabouço fiscal também não limita despesas como o fundo da educação básica (Fundeb) e o piso da enfermagem já aprovado pelo Congresso.
O que o governo espera alcançar?
Caso o novo arcabouço seja aprovado e implementado, o governo prevê:
- zerar o déficit público da União no próximo ano;
- superávit de 0,5% do PIB em 2025;
- superávit de 1% do PIB em 2026;
- e estabilizar a dívida pública da União em 2026, último ano do mandato do presidente Lula.
Na avaliação de equipe de Haddad, o ajuste é importante, mas gradual. A previsão é que, neste ano, o governo feche com déficit na casa dos R$ 100 bilhões.
Segundo o governo, com o novo arcabouço, será possível estabilizar a dívida pública da União em 2026, último ano do mandato do presidente Lula, a no máximo em 77,3% Produto Interno Bruto (PIB). Porém, a dívida pública não é uma meta, e sim um objetivo do governo.
Quando começa a valer?
O novo arcabouço fiscal passa a valer assim que for aprovado pelo Congresso Nacional, como um projeto de lei complementar. Propostas desse tipo precisam de maioria absoluta de votos favoráveis, de 257 votos na Câmara dos Deputados e 41 votos no Senado.
A medida precisa, portanto, de menos votos do que foi necessário para aprovar o teto de gastos, que era uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Para ir à promulgação pelo Congresso, uma PEC precisa ser aprovada em dois turnos, na Câmara e no Senado, com apoio de, no mínimo, 308 deputados e 49 senadores.
A “anulação” do efeito constitucional do teto de gastos já foi tratada pela PEC da Transição, aprovada enquanto o governo Lula ainda era formado. O texto dava prazo até o fim de agosto para que fosse enviado ao Congresso um novo regime fiscal em substituição ao teto de gastos, mas não há um prazo exato para aprovação.
Mas o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou nesta quinta-feira que a proposta deve chegar ao Congresso Nacional já na próxima semana, antes do feriado.
O Planalto trabalha para que o orçamento de 2024 já seja construído com base no novo arcabouço fiscal, já que ele prevê metas de crescimento da economia e de controle dos gastos já para o próximo ano.
G1