“Não fui eu que a escolhi como filha, foi ela que me escolheu como mãe”. O depoimento carregado de emoção, em uma chamada de vídeo do Whatsapp, do outro lado do País, na Carolina do Norte (EUA), é da dona de casa Renata Cotian de Matos Souza, de 44 anos, ao se referir a filha adotada, a pequena Bella Victória, que completará 3 anos no próximo dia 20 de fevereiro. Após um longo e desgastante processo de quase 2 anos, Renata finalmente pôde levar a filha para casa, nos Estados Unidos, onde reside há 17 anos, graças a intermediação da Comissão Estadual Judiciária de Adoção do Estado de Goiás (Cejai), da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Goiás.
A adoção internacional, a primeira ao longo de 10 anos, ocorre justamente durante uma das gestões mais exitosas da CGJGO, que termina nesta segunda-feira (1º) e está sob a responsabilidade do desembargador Kisleu Dias Maciel Filho, que se empenhou pessoalmente para que o processo fosse concluído com a maior celeridade possível, juntamente com o secretário executivo da Cejai, juiz Donizete Martins de Oliveira, auxiliar da CGJGO. A história da pequena Bella, cujo desfecho foi muito feliz, começa com a sua própria árvore genealógica, pois ela já fazia parte da família do marido da Renata, o militar Reinaldo Borges de Souza, 46 (é filha biológica de um tio do seu esposo).
Contudo, várias dificuldades inerentes de questões pessoais impediram a criança de ficar com os pais biológicos. Desta forma, a guarda acabou ficando temporariamente com o irmão de Reinaldo, já que os outros parentes já estavam com idade avançada. Mesmo sem nunca ter visto Bella, ainda um bebê, Renata experimentou um sentimento diferente pela menina em seu coração: o amor maternal. “Me apaixonei sem ver a Bella, não sei explicar, foi um amor avassalador, ela simplesmente era minha filha e decidi que lutaria por ela até o fim”, conta, comovida.
Mesmo enfrentando todos os tipos de obstáculos e trâmites burocráticos, Renata veio para o Brasil deixando o marido e o filho mais velho de 21 anos nos EUA para acompanhar de perto todo o rito da adoção, que durou praticamente dois anos. “Sou apaixonada por crianças e sempre quis ter outro filho, cheguei a fazer três tentativas anteriormente, mas tive abortos espontâneos. Quando minha sogra mandou as fotos da Bella, que nasceu prematura com 1,6 kg e 600 gramas, meu coração se inundou de amor, exatamente o mesmo sentimento que tenho pelo meu filho biológico, hoje com 21 anos. O que fala mais alto nesses casos é o instinto de acolhimento, de proteção. Não pestanejei nem por um segundo em vir para o Brasil e esperar que tudo desse certo mesmo conhecendo os entraves porque eu só pensava e queria minha filha comigo”, enfatizou.
O início
Contudo, para chegar até o final feliz a luta foi árdua, conforme explica Renata. Ela relata que inicialmente ela e o marido não sabiam direito onde e quem procurar para iniciar o processo de adoção internacional (que deveria começar nos EUA, País de residência, mesmo os dois sendo brasileiros, como estabelece a Convenção de Haia, na qual o Brasil também é signatário). Segundo a mãe adotante, ambos procuraram uma agência internacional e tiveram auxílio do advogado Victor Matheus Borges Vieira, representante regional para o Estado de Goiás da Hand in Hand International Adoption, que entrou em contato com a secretária da Cejai-GO, Renata Souza Dias Locatelli de Oliveira.
“Através da agência de adoção internacional conseguimos um advogado em Goiás que entrou em contato com a Renata. Apesar da demora e da burocracia, que fazem parte do processo de adoção internacional por seguir muitas normas previstas inclusive na Convenção de Haia, sou muito grata a todos que se empenharam e nos ajudaram a ter nossa filha conosco como o dr. Victor, que é um excelente advogado, e a Renata da Cejai, que nos ajudou o tempo todo em tudo o que foi necessário. É importante que as outras pessoas interessadas na adoção entendam que não é só ir lá e pegar a criança, fui bem muito bem orientada e também tínhamos a nosso favor o fato da Bella já integrar a família. Não tenho como retribuir o que tanta gente fez de bom para nós, todos os envolvidos nesse processo, só posso agradecer, de todo o coração”, externou.
Já em casa, Bella curte agora a cabaninha de estrelinhas coloridas que a mãe comprou somente para ela e brinca com os dois cachorrinhos de estimação, que também fazem parte da família. “Sei que a minha filha tem agora um bom lar, estruturado e saudável, e desfruta de um ambiente tranquilo. No entanto, jamais esconderemos dela sua própria história e a deixaremos à vontade para conhecer os pais biológicos lá na frente, se esse for o seu desejo. Sabemos que no futuro ela será uma pessoa realizada e feliz e nossa convicção é de que cumprimos uma importante missão nesta trajetória: a de mudar a vida de um ser humano. Outras famílias adotantes devem compreender esse lado, o que está em jogo é a vida de outra pessoa. A adoção é um ato de amor e crescimento, nos tornamos melhores, sem sombra de dúvida”, frisa.
Satisfeita e também emocionada com o sucesso desta adoção internacional, a secretária da Cejai-GO, que fez questão de dar todo o suporte aos pais no caso da Bella, inclusive acompanhando a expedição do passaporte de emergência da menina e a partida no aeroporto da garota com os pais para os EUA, afirma que felicidade estampada no rosto da criança não tem preço. “O processo da Bella mexeu com todos nós pelo histórico tão bonito, pela luta dos pais adotantes em realmente desejarem propiciar a ela uma vida melhor. Não é um procedimento simples, mas também nos esforçamos ao máximo para que tudo acontecesse mais rápido para o bem dessa criança e dos pais. O Ministério Público também deu parecer favorável pelo vínculo de parentesco já comprovado e o corregedor-geral nos fez um pedido pessoal para que fizéssemos um esforço concentrado e nos empenhássemos ao máximo para concluir com sucesso esse processo”, realçou.
Sobre a Cejai-GO
A Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional do Estado de Goiás – CEJAI-GO, foi instituída pela Resolução nº 14/1996, de 30 de novembro de 1996, alterada pelo artigo 1º da Resolução nº 43/2001, de 22 de agosto de 2001, do Tribunal de Justiça de Goiás e reestruturada pela decisão do Órgão Especial de 14 de fevereiro de 2005, constante do Ofício nº 2.262/2004 – DIN, de 19/10/2004, da CGJGO como CEJAI/GO, com fulcro no art. 52 do ECA (Lei nº 8.069, de 13 julho de 1990).
É presidida pelo Corregedor-Geral da Justiça do Estado de Goiás e composta por quatro membros: um juiz (a) auxiliar da Corregedoria e três magistrados(as) aposentados(as) e/ou juízes de direito, desde que não exerçam função na Vara da Infância e da Juventude, além de representantes do Ministério Público.
Seu objetivo precípuo é o estudo e análise das adoções internacionais, visando a redução do tráfico de crianças, com os riscos que lhe são inerentes a partir de mecanismos que não permitam a saída destas de Goiás, conduzidos por estrangeiros que não tenham se submetido às leis e regulamentos da CEJAI.
Cuida também do auxílio aos juízes da Infância e da Juventude nos procedimentos relativos à adoção nacional, propiciando a colocação familiar de crianças em lares brasileiros, a partir do cadastramento no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA). Nos casos de adoção internacional, busca-se o encaminhamento de crianças e adolescentes não passíveis de adoção nacional a estrangeiros.
Adoção internacional
A adoção internacional é a forma de colocação da criança ou adolescente em lar substituto quando esgotadas todas as possibilidades de colocação em famílias adotivas residentes no País. Na legislação brasileira, considera-se adoção internacional aquela na qual os pretendentes, ainda que sejam brasileiros, ou as crianças tenham residência ou domicílio fora do Brasil.
Os adotantes que se submetem ao processo de habilitação para adoção internacional passam pelo duplo crivo: no país de acolhida e aqui no Brasil. Após a adoção, os organismos internacionais são obrigados a enviar quatro relatórios durante dois anos com informações sobre o dia a dia delas e adaptação ao novo país.
Ainda, desde 1º junho 1999, o Brasil exige como requisito para deferimento da adoção internacional que o país de residência dos pretendentes tenha assinado à Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, concluída na Convenção de Haia, em 29 de maio de 1993.
A pessoa ou casal brasileiro que resida no exterior deverá seguir o mesmo procedimento daqueles que residem no Brasil, exceto pelo fato de que o estágio de convivência deve ser cumprido tem território nacional, no mínimo, 30 dias, e, no máximo, 45 dias, prorrogável por igual período, uma única vez, mediante decisão fundamentada da autoridade judiciária.
Por outro lado, o procedimento de adoção internacional para pessoa ou casal estrangeiro é mais burocrático, pois exige o preenchimento de formulário de pedido de habilitação no país que residam os pretendentes, avaliações de aptidão, com posterior emissão de relatório favorável que justifique a aptidão para assumir a adoção.
Toda a documentação será enviada ao Brasil, traduzida e autenticada, assim como, o estudo psicossocial elaborado por equipe interprofissional e cópia autenticada da legislação pertinente e vigente. O Brasil poderá fazer exigências e solicitar complementação. Após análise de toda a documentação enviada, a compatibilidade e preenchimentos dos requisitos, será expedido laudo de habilitação à adoção internacional, que tem validade por, no máximo, 1 ano.
De posse do laudo de habilitação, o interessado estará autorizado a formalizar o pedido de adoção perante o Juízo da Infância e da Juventude do local em que se encontra a criança ou adolescente brasileiro pretendido. Estudos realizados nos últimos anos por vários Tribunais do Brasil demonstram que a adoção nacional supera em 25 vezes a internacional.