Os olhos de Greg Brittles brilham de entusiasmo quando ele explica o projeto em que está trabalhando.
“Na verdade, é o sonho de todo engenheiro ter um projeto que seja tecnicamente desafiador, que exija que você desenvolva novas tecnologias e soluções para problemas difíceis, mas que também seja importante para o mundo ao mesmo tempo”, afirmou à BBC.
Desde que concluiu sua pesquisa na Universidade de Oxford, cinco anos atrás, ele tem trabalhado para a Tokamak Energy, uma start-up do Reino Unido que tem planos de construir um reator de fusão.
A fusão é a reação que alimenta o Sol e todas as outras estrelas. Se essa energia pudesse ser aproveitada na Terra, forneceria uma fonte abundante, a partir de apenas uma pequena quantidade de combustível e sem produzir dióxido de carbono.
O princípio é fácil de entender. Pegue os átomos de hidrogênio, adicione calor e pressão suficientes e eles vão se fundir para formar o hélio. Durante esse processo, parte da massa de hidrogênio é transformada em calor, que pode ser usada para produzir eletricidade.
O problema é que, para fazer a fusão acontecer, é preciso aquecer os isótopos de hidrogênio a centenas de milhões de graus, até que eles se tornem tão energéticos que se separem em um estado giratório de matéria chamado plasma.
O desafio sempre foi conter esse plasma. As estrelas fazem isso com a gravidade, mas na Terra o método mais comum é usar campos magnéticos poderosos para manter o plasma confinado.
Grande parte do desafio de engenharia se resumiu à construção de ímãs: eles precisam ser poderosos o suficiente para conter uma massa de matéria incrivelmente quente e rodopiante.
Ainda neste ano, Bob Mumgaard e sua equipe da Commonwealth Fusion Systems (CFS) vão testar um ímã inovador que, segundo eles, pode dar esse salto tecnológico.
Pesando 10 toneladas, o ímã em forma de D é grande o suficiente para acomodar uma pessoa. Cerca de 300 km de uma fita eletromagnética muito especial é enrolada na forma da letra D.
A fita em si é um feito de engenharia que levou décadas para ser desenvolvida. Camadas finas de óxido de cobre e bário de terras raras supercondutor (ReBCO) são depositadas em uma fita de metal. Quando resfriado, esse feixe de fita pode conduzir eletricidade de forma extremamente eficiente, o que é essencial porque 40 mil amperes vão passar por ele, eletricidade suficiente para abastecer uma pequena cidade.
Quando o local de fusão está resfriado, isso significa que a fita está resfriada a menos 253º C, o que pode soar absurdamente frio, mas no mundo dos materiais supercondutores é uma temperatura bastante quente.
“A geladeira que estamos usando é como uma geladeira que caberia em uma cozinha comum”, disse Mumgaard, co-fundador e presidente-executivo da CFS.
“É a mesma coisa com a geração anterior de tecnologia… precisaríamos de uma geladeira do tamanho da sua casa (para ter o mesmo efeito).”
A CFS está planejando um reator que abrigará 18 desses ímãs, dispostos em um anel – uma configuração conhecida como tokamak – e recentemente selecionou um local para a instalação do reator em Massachusetts, nos Estados Unidos.
“Fomos os primeiros a realmente obter esse ímã, indo além de um modelo em escala reduzida, com P&D [pesquisa e desenvolvimento] realizado por empresas menores e alguns laboratórios nacionais”, diz o engenheiro.
“Agora, estamos todos empenhados na construção de máquinas de fusão. Você não precisa passar de algo em uma espécie de escala de brinquedo para algo que está em escala de fusão”, diz Mumgaard.
O salto em tecnologia magnética também é fundamental para o projeto de fusão da Tokamak Energy no Reino Unido.
Brittles passou os últimos cinco anos desenvolvendo essa tecnologia e atualmente está ajudando a construir um demonstrador que terá uma série de ímãs poderosos trabalhando em conjunto.
“Será uma montagem de muitas, muitas bobinas gerando forças que estão interagindo e puxando umas às outras, formando um conjunto equilibrado. Isso tem que ser controlado ou as forças podem ficar desequilibradas”, explica.
As forças que esses campos magnéticos podem gerar são enormes. Brittles compara a potência total da força gerada por seus ímãs ao dobro da pressão no fundo da mais profunda fossa do oceano.
Quando esses ímãs estiverem prontos, serão colocados em um tokamak esférico – um reator de fusão em forma de maçã.
A pesquisa sugere que tal projeto irá gerar mais energia para cada unidade do que o tokamak comumente usado até hoje.
“O verdadeiro desafio é a fusão comercial. E é isso que realmente está nos impulsionando, porque estamos nos concentrando no tokamak esférico por causa das vantagens comerciais de longo prazo”, diz David Kingham, um dos fundadores da Tokamak Energy e atualmente vice-presidente executivo da empresa.
“Acreditamos que nossa tecnologia será colocada em uma planta piloto de fusão no início de 2030”, diz ele.
“Acho que será uma corrida global. Existem empreendimentos privados interessantes nos Estados Unidos. E estaremos em uma corrida com eles.”
A promessa de um reator de fusão funcional já existe há décadas.
O maior projeto está em andamento no sul da França, onde um consórcio de nações está construindo o ITER, um reator gigante que custou bilhões de libras para ser construído e está há anos atrasado.
No entanto, projetos mais compactos como os planejados pela Tokamak Energy e CFS estão atraindo investidores privados, que apostam em sua possível viabilidade comercial.
Wal van Lierop fundou sua empresa de capital de risco, a Chrysalix, há 20 anos e, desde 2008, investiu dezenas de milhões de dólares na empresa canadense General Fusion.
Historicamente, diz ele, a indústria de fusão tem lutado para levantar financiamento, em parte porque muito dinheiro foi investido no ITER, mas esse cenário está mudando, diz.
“Vejo mais dinheiro sendo investido, mais juros e as pessoas estão começando a perceber que essa é uma tecnologia de plataforma muito grande e que não é mais algo que pode ou não funcionar até 2050.”
O executivo ressalta que o potencial é enorme. O mercado global de eletricidade vale cerca de US$ 3 trilhões (mais de R$ 15 trilhões) por ano e tende a crescer.
“Se esta (fusão) for bem-sucedida, isso abrirá a maior transição da indústria que já vimos.”
De volta à face do carvão (ou talvez face do plasma), Brittles confessa que ainda há muito trabalho de engenharia a ser feito, mas ele está confiante. “Estamos trabalhando duro para enfrentar muitos desafios”, diz.
G1