Em decisão inédita na comarca de Mozarlândia, a juíza Marianna de Queiroz Gomes, da 1ª Vara Judicial local, julgou procedente o pedido de uma transexual para retificação de nome e gênero constantes em sua certidão de nascimento, sem a realização de procedimento cirúrgico afirmatório. A magistrada esclareceu que este foi o primeiro pleito de uma transexual solicitando a retificação de nome e gênero na cidade de Mozarlândia.

Gabriel Augusto ajuizou a ação de retificação de nome e gênero constantes em seu assento de nascimento, sem a realização de procedimento cirúrgico afirmatório (transgenitalização), o que, para a magistrada, constitui oneroso processo de anos, até mesmo décadas a fio, ao qual se associam severos riscos e consequências à saúde, dentre as quais, a óbvia infertilidade permanente. “Não raro se tratando de procedimento contraindicado, em certos casos, sob a ótica clínica e, em outros, indesejável ou inacessível a parcela substantiva de seus potenciais candidatos”, ressaltou a juíza de Mozarlândia.

Em suma, Gabriel Augusto alegou não se identificar com o gênero masculino, a despeito de sua morfologia biológica. Disse que sempre reprovou o sexo que possuía, além de não aceitar o próprio corpo. Argumenta que há alguns anos vem trabalhando a modificação do seu corpo para o sexo feminino, com o uso de hormônios e acompanhamento psicológico. Expôs que a aparência de mulher contrastando com o registro de homem causa-lhe transtornos e constrangimentos sociais, além de abalos emocionais e existenciais em razão do preconceito da sociedade.

Na sentença, proferida em 1º de fevereiro de 2022, foi determinado a retificação do registro civil da parte autora para alterar seu prenome doravante, Maria Eugênia em substituição ao prenome constante, mantidos os patronímicos (sobrenomes) bem como sua indicação de gênero, de masculino para feminino. Os nomes Gabriel Augusto e Maria Eugênia são fictícios para preservar a identidade da parte autora.

Identidade sexual

A juíza Marianna de Queiroz Gomes salientou que há uma notória diferenciação entre sexo biológico e sexo psicológico, sendo que o primeiro não pode ser o único considerado para a identificação do ser humano. Para ela, a identidade sexual é de suma importância na definição da personalidade do indivíduo, por ser a forma como o próprio se identifica perante a sociedade e internamente, influenciando diretamente em seu comportamento. “Nesse passo, sem qualquer consideração às particularidades pessoais e médicas, prescrever indistintamente pela via judicial, à maneira das provas de fé, a mutilação prévia como requisito ao reconhecimento da dignidade equivaleria, com devida vênia, a vilipendiá-la desde logo”, salientou a magistrada.

Para a juíza, ainda que a parte não tenha pretensões de se submeter a cirurgia para a alteração de sexo, isso não pode constituir empecilho ao deferimento do pedido. “Conclui-se, portanto, que a parte postulante identifica-se como sexo diverso, o que impede de qualquer intervenção cirúrgica”, conclui a juíza da 1ª Vara Judicial de Mozarlândia.