“Parar” não é um verbo utilizado no setor de produção agropecuária. Mesmo no cenário de pandemia, a demanda por produção de alimentos e outros itens básicos certamente se mantém de pé. Entretanto, o agro registra diferentes movimentos em razão das medidas de isolamento. A alta do dólar, por exemplo, ao mesmo tempo que favorece as exportações, encarece a produção. As feiras, que ficaram fechadas por duas semanas, ainda vivem situação delicada, pressionando comerciantes a buscarem medidas para contornar a crise.

Em relatório divulgado na semana passada, a consultoria Cogo – Inteligência em Agronegócio, aponta para os impactos da crise gerada pelo coronavírus no setor. Enquanto o milho, feijão, café e proteína animal registram altas, outros como leite, frutas e legumes chegam a acumular baixas.

No entanto, segundo o coordenador técnico do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Leonardo Machado, parte das oscilações demonstradas decorrem de mais de um fator. “Um conjunto de coisas, já que há variações em relação ao ano passado”, explica Leonardo. O coordenador pontua, entretanto, que no caso do feijão, por exemplo, com alta acumulada de quase 60% em 30 dias, há relação direta com a pandemia.

“Com as medidas de isolamento social, o consumo de feijão nos supermercados se elevou muito, aumentando a demanda num curto espaço de tempo. Com isso, o preço disparou”, completa o coordenador.

Outros movimentos 

O relatório da Cogo detalha ainda outros impactos. O preço da soja bateu recorde em razão do alto valor do dólar. Além do feijão, já citado, outros itens da cesta básica registram altas, essas também ligadas ao aumento do consumo no varejo.

Com o preço do petróleo seguindo a tabela mundial, a sequência de ajustes da Petrobras, que acumula 43%, pressiona o etanol e o açúcar do país. Vale destacar aqui que a queda do preço da gasolina não chegou de forma expressiva nos postos de combustíveis, registrando, de acordo com o Procon, redução de cerca de 5% para o consumidor final.

Além dos destaques negativos do relatório, o mercado de flores e ornamentação sofre ainda mais intensamente. Sem eventos sociais por todo o país, a demanda reduziu drasticamente.

O setor de frutas e verduras registra, segundo a Cogo, pouco giro de vendas no comércio. Os compradores estariam receosos em manter os pedidos, correndo o ricos de acumularem sobras. “Muitas redes de supermercados anteciparam compras, mas o momento é de apreensão, pois esse aquecimento na demanda deve ser apenas momentâneo”, detalha o relatório.

Feiras 

Para o coordenador do Ifag, Leonardo Machado, é necessário atenção especial aos feirantes. “É um setor que está estritamente ligado ao consumo interno, além disso, por ser um produto perecível qualquer queda na demanda causa perdas nos preços”, explica Leonardo, que defende disponibilização de linhas de crédito, prorrogação de dívidas e diferimento de impostos para esses comerciantes.

Sobre o risco de desabastecimento do setor, pautado em um vídeo polêmico compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro nesta semana, Leonardo afirma que não há o risco. “O agro continua a produzir e as autoridades tem se esforçado para dar condições a esta produção, logística e todas as outras estrutura de apoio para comercialização”, defende.

Apesar das dificuldades, os comerciantes não poupam esforços para contornar a crise. Produtor e vendedor de orgânicos em Goiânia, Edson Vieira diz que até o final desta semana, com as feiras que faziam fechadas, estava realizando entregas a domicílio. Como sua fazenda fica em no município de Gameleira, o agricultor recebe as encomendas durante a semana e faz as entregas aos sábado.

Quanto aos possíveis prejuízos, Edson não reclama, diz que a quantidade de novos cliente para entrega aumentou.  “Estamos pegando produtos com outros produtores do nosso grupo da Adao pra atender a demanda”, conta o produtor, explicando a ação coletiva entre os produtores da Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica de Goiás (Adao-GO).

Confira os produtores de orgânicos que realizam entregas na região metropolitana. 

Na edição do decreto que estendeu a quarentena no comércio por mais 15 dias, o Governo Estadual flexibilizou alguns serviços. Entre os que poderão retornar ao trabalho, as feiras livres para venda de hortifrúti deverão funcionar com práticas sanitárias e “sem o funcionamento de praças de alimentação, o consumo de produtos no local e a disponibilização de mesas e cadeiras aos frequentadores”, detalha a cartilha de quais estabelecimentos abrem e o que se mantém fechados.

Exportações

Nessa semana o dólar bateu novo recorde, valendo R$ 5,35 no fechamento da sexta-feira, 3. Essas oscilações cambiais, somadas a alta demanda de várias commodities, interfere diretamente na balança comercial. Ao site, o superintendente de Negócios Internacionais do Estado de Goiás, Edival Lourenço Júnior, explica as principais questões que cercam as exportações neste momento.

Conforme relembra o superintendente, Goiás sente os impactos do coronavírus antes mesmo de se tornar uma pandemia. Maior importador de produtos goianos, a China implantou medidas severas de restrição social desde de janeiro, o que, destaca Edival, resultou em um dos piores resultado da balança comercial dos últimos anos. “Mesmo assim, conseguimos manter o saldo positivo, enquanto o Brasil ficou negativo”, explica o especialista.

Um mês depois do inicio da quarentena chinesa, no entanto, o mês de março registrou o segundo melhor resultado comercial do período nos últimos 10 anos, informa Edival. “Tivemos exportações de 748 milhões de dólares e importações de 278 milhões, ou seja, um saldo positivo de 469 milhões “, segue detalhando os dados da balança comercial goiana.

Para os próximos meses, o superintendente diz que há tendência de crescimento, e explica o porquê: “O principal motivo disso é que, mesmo quando a China esteve paralisada, Goiás sentiu menos pela nossa característica de produtos in natura. Produtos primários são os últimos que você deixa de comprar. Você deixa de comprar o supérfluo, de muito valor agregado, mas o produto primário segue sendo menos impactado”.

Fonte: Jornal Opção