Sob longos aplausos e música, fãs, familiares e amigos despediram-se do dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, 86 anos, morto nessa quinta-feira (6). “Evoé!”, a palavra ecoou pelo Teatro Oficina. Era o que também gritavam os participantes dos bacanais como forma de invocar Baco, deus do vinho e das festas. Bacantes foi um dos espetáculos dirigidos por Zé Celso.

O velório no Teatro Oficina seguiu por toda a madrugada e, pela manhã, uma fila de admiradores ainda aguardava para o último adeus ao dramaturgo. Por volta das 9h, assim como foi feito durante a madrugada, uma ciranda foi formada para que todos da fila pudessem se aproximar do corpo e se despedir. O velório se encerrou por volta de 12h. Em seguida, o corpo foi levado ao Cemitério e Crematório Horto da Paz, em Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo.

O ator Luciano Costa, de 51 anos, veio de Osasco para se despedir do ídolo. “O Zé Celso Martinez é a história do Brasil, do teatro, das artes, não só para São Paulo, no Teatro Oficina, mas ele é como se fosse um cordão umbilical de todos os brasileiros”, disse à Agência Brasil.

Para ele, é fundamental se solidarizar com outras pessoas que compartilham da mesma dor. “É uma solidariedade ao teatro, é festa, ele não queria tristeza. Teatro é também meu sangue. Como dizia João Cabral de Melo Neto, nosso sangue tem uma cor só, é vermelho, da luta”, afirma.

A também atriz Carmelita Soares, de 73 anos, faz teatro há mais de 30 anos. Apesar de morar perto do Teatro Oficina, nunca viu um espetáculo. “Mas eu quero vê-lo com amor e coração. Tudo tem seu dia e sua hora. Se eu pudesse, teria feito teatro com ele”, conta.

Inspiração


Dorberto Carvalho, do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de São Paulo (Sated-SP), destacou o legado de Zé Celso. “Ele é uma poética, um homem poética que deixa um monte de discípulos. Tem gerações de artistas que se inspiraram e se inspiram no Zé Celso. A poética dele não morre, morre o corpo. Tudo que ele construiu nesse espaço, na Rua Jaceguai, vai permanecer e isso vai retroalimentar novas gerações que vão vir e vão discutir”, apontou.

Macumba Antropofágica foi a primeira peça de Zé Celso que o advogado Artur Prado assistiu na cidade dele, Araraquara, a mesma onde nasceu o dramaturgo. “Ele marcou muito minha experiência com a cidade de São Paulo, inclusive porque nós dois saímos de lá e viemos pra cá. Estudamos na mesma faculdade, então ele simboliza pra mim essa ideia de vir pra cidade grande fazer arte, acho que esse é um símbolo importante pra mim”, relata.

Bacantes, uma adaptação da peça de Eurípides que retrata embates entre um rei repressor e um deus libertário, é o espetáculo preferido de Prado. “É bastante coisa para absorver, mas ele vai te conquistando e essa coisa de se deixar levar pelo que se está sentido e o teatro dele é um pouco do que se está sentindo, para a plateia e para quem atua também”, aponta.

Incêndio


Zé Celso estava internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital das Clínicas, na capital paulista, desde terça-feira (4) após um incêndio ter atingido o apartamento em que morava em São Paulo. O fundador do Teatro Oficina teve 53% de seu corpo queimado.

O mais longevo dramaturgo em atividade, Zé Celso Martinez deixa o legado de uma arte que revolucionou a política e os costumes. Zé Celso deixa legado de arte que revolucionou política e costumes.

Uma das características dos espetáculos do dramaturgo é a encenação para o grande público, de graça, ao ar livre ou em grandes espaços. Exemplo desse formato é As Dionisíacas.