O poder público precisa enviar mais homens e equipamentos para o combate às queimadas no Pantanal. A avaliação é de especialistas que participaram nesta sexta-feira (2) de uma audiência pública virtual promovida pela comissão temporária externa do Senado que acompanha as ações de enfrentamento aos incêndios no bioma. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), são quase 18 mil focos de chamas em 2020 — um aumento de 200% em relação ao ano passado.

O combate às queimadas é realizado por 500 brigadistas, com o apoio de 500 militares do Exército, da Marinha e da Força Aérea. De acordo com o subchefe de Operações do Estado-Maior das Forças Armadas, general José Eduardo Leal de Oliveira, mais de 14 aeronaves foram empregadas no enfrentamento ao fogo desde julho.

— São basicamente helicópteros e um avião Hércules com um sistema que permite o lançamento de água, principalmente em pontos de mais difícil acesso. O êxito dessas ações permitiu reduções superiores a 80% no que se refere a focos de queimada e incêndio. Mas vivemos uma seca histórica na região do Pantanal, o que em muito dificulta o completo controle da situação — afirma.

Para o representante do Inpe, Alberto Setzer, a estrutura oferecida pelo poder público não é suficiente. O engenheiro ambiental explica que a situação no Pantanal é “quase impossível de ser administrada” com o cenário de estiagem, temperatura alta, umidade baixa e ventos fortes.

— De um lado, temos essas frentes avançando de maneira descontrolada, cobrindo dezenas de quilômetros quadrados. De outro lado, temos apenas algumas centenas de brigadistas. Mesmo combinando as Forças Armadas com os brigadistas e voluntários, temos cerca de mil pessoas. Esse número obviamente está subdimensionado. Precisaríamos de 10 vezes mais. Muito possivelmente, 100 vezes mais pessoas lutando para conseguir enfrentar uma situação descontrolada como essa, que já perdura por meses — afirmou.

A presidente da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema), Mauren Lazzaretti, destaca a dificuldade para a aquisição de insumos usados no combate às chamas. Ela explica que o fato de o Pantanal ser o bioma mais preservado no Brasil dificulta o acesso a áreas remotas, o que exige uma “situação de guerra” para o enfrentamento ao fogo.

— As chamas no pantanal têm alcançado mais de 25 metros de altura, o que inclusive impossibilita os homens de fazerem esse combate. Isso mostra que uma outra estratégia precisa ser adotada: o combate aéreo e a utilização de outros produtos que busquem retardar (os incêndios) ou melhorar a eficiência do combate aéreo. Além do intenso calor e da seca, temos dificuldade de adquirir os insumos para fazer esse combate — afirmou. 

Responsabilidades

A audiência pública interativa contou com a participação de internautas, que enviaram perguntas aos debatedores. Um dos questionamentos frequentes foi sobre a responsabilização dos causadores das queimadas.

De acordo com o Centro Integrado Multiagências de Coordenação Operacional de Mato Grosso, o fogo no estado é causado pela ação humana — como a queima de áreas para o pasto, o uso de fogo para a retirada de mel em colmeias e a incineração de equipamentos agrícolas. Em Mato Grosso do Sul, cinco fazendeiros são investigados pela Polícia Federal por queimadas supostamente intencionais.

O diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro, Valdir Colatto, informou que o Pantanal conta com 7,7 mil propriedades privadas registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Apesar da ocupação humana, o bioma ainda preserva 479 nascentes e 8,4 milhões de hectares de vegetação nativa, o equivalente a 55% da área total. Colatto relativizou a eventual participação de fazendeiros nas queimadas.

— Precisamos observar o nexo causal. Quem causou o incêndio? Às vezes, estão se cometendo injustiças. As pessoas colocando o proprietário como o responsável pelo incêndio, quando o incêndio normalmente surge nas vias públicas e nas estradas, no descuido das pessoas que transitam por lá — disse.

A presidente da Abema, Mauren Lazzaretti, destacou que os órgãos ambientais de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul estão focados no levantamento de dados, na identificação e na responsabilização dos causadores de incêndios. Ela disse, no entanto, que o proprietário rural não deve ser sempre apontado como “vilão”.

— Avançamos muito na construção de alternativas. Muitos produtores possuem hoje pequenas estruturas de combate a incêndios dentro de seus imóveis rurais. Essa é uma estratégia que pode se mostrar eficiente para, em vez de transformar o produtor em infrator e vilão, incorporá-lo como agente que pode auxiliar nesse evento, que é comum para países tropicais — sugeriu. 

Estatuto 

O presidente da comissão externa, senador Welington Fagundes (PL-MT), defendeu uma série de ações para tentar prevenir novas catástrofes. Entre as medidas, ele sugere harmonização da legislação ambiental nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, linhas de crédito para a retomada do turismo e da pecuária na região e investimentos em saneamento básico.

— Não podemos descansar. A seca vai continuar intensamente, e isso exige que façamos um planejamento para evitar as ocorrências tristes e catastróficas como as que vêm acontecendo. A estiagem deste ano ultrapassou todas as condições normais do Pantanal e superou a capacidade das instituições públicas e até dos pantaneiros, acostumados a lidar com os ciclos da seca e da cheia — disse.

Fagundes está em Corumbá (MS), onde participa neste sábado (3) de uma diligência promovida pela comissão externa. Os parlamentares devem fazer um sobrevoo de helicóptero às áreas atingidas e, em seguida, promover uma reunião de trabalho no Centro de Convenções do Pantanal. O relator da comissão, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), deve sugerir um projeto de lei com normas gerais de proteção ao bioma, o chamado Estatuto do Pantanal.

A comissão externa tem duração prevista de 90 dias. Também compõem o colegiado os senadores Carlos Fávaro (PSD-MT), Esperidião Amin (PP-SC), Jayme Campos (DEM-MT), Fabiano Contarato (Rede-ES), Simone Tebet (MDB-MS) e Soraya Thronicke (PSL-MS).

Fonte: Agência Senado