Em toda sua complexidade, um jogo de futebol pode ser explicado de muitas maneiras. Quando se vê os melhores momentos da derrota do Flamengo para o São Paulo no Maracanã, uma rápida conclusão é alcançada: falhas individuais culminaram na goleada sofrida. Esta, porém, é apenas a parte mais visível.

Obviamente, é impossível fazer qualquer análise sem levar em consideração as falhas. Bruno Henrique e Pedro perderam pênaltis em momentos cruciais: o primeiro colocaria o Flamengo em vantagem num momento em que jogava bem e até dominava o jogo; o segundo devolveria a esperança logo após o São Paulo ampliar a vantagem em 3 a 1.

Se no ataque o Flamengo “perdoou” duas vezes, do outro lado do campo o São Paulo foi muito mais eficiente. Em dois erros cruciais de Gustavo Henrique, dois gols: primeiro, um corte errado que faz a bola cair nos pés de Brenner; depois, um pênalti atabalhoado facilmente convertido por Reinaldo.

Qualquer time acometido por estes quatro erros teria muitas dificuldades para vencer uma partida.

Um problema antigo

Mas o que dizer, por exemplo do primeiro gol do São Paulo? Em meio às falhas individuais, outros momentos da partida, tão importantes quanto, não são revistos com o mesmo escrutínio.

O gol de Tchê Tchê, expôs o maior ponto fraco do Flamengo de Domènec Torrent desde muitos jogos: o desequilíbrio na transição defensiva. Reveja o lance e note o espaço entre a linha de defesa e o meio-campo. A facilidade com que o são-paulino pega o rebote e tem todo o tempo do mundo para colocar a bola no ângulo.

Gerson, do Flamengo — Foto: André Durão

Gerson, do Flamengo — Foto: André Durão

A transição defensiva do Flamengo vem sendo um problema difícil de resolver. Tem muito a ver com treino – ou a falta dele – e a forma como o clube se propõe a jogar. Principalmente depois da Era Jesus, espera-se que o Flamengo seja ofensivo e, principalmente, pressione, que faça uma marcação alta, sufocante, como nos melhores momentos de 2019.

Dome se adaptou ao Flamengo e conseguiu fazer o time executar muitas de suas ideias. Mas esta pressão ainda não está ajustada. Não só em seu momento mais visível, com os jogadores de frente, mas especialmente na forma como o meio-campo e a defesa se posicionam em campo. Falta maior automatismo de movimentos, maior compactação.

Defender alto é complexo e exige tempo de trabalho, e talvez seja o maior preço que Dome paga pela maratona insana que lhe toma sessões de treino.

Média de 1,3 gol sofrido por jogo no Brasileiro

O resultado é uma exposição contínua – lembre das muitas boas defesas de Hugo Souza em partidas recentes. Entre os cinco primeiros colocados do Campeonato Brasileiro, o Flamengo tem a pior defesa: são 25 gols sofridos em 19 jogos – média de 1,3 gol por jogo. Em apenas três jogos neste turno, a equipe não foi vazada.

O curioso é que o foco do grande público não está nisso. O “jogo posicional” de Dome vira debate em todas as rodadas, mas a parte ofensiva está muito mais desenvolvida nesta altura do trabalho. Atacar do jeito que o técnico quer não é mais problema para o Flamengo. A própria produção ofensiva contra o São Paulo esteve longe de ser algo debatido.

Resta, agora, corrigir a defesa. Não só a última linha, que acaba exposta e mais sujeita a falhas, mas também meio-campo e ataque. É o obstáculo que o Flamengo precisa superar para dar um salto de qualidade e ganhar força na briga pelos títulos.

G1